O CNB/GO conversou com Marcelo Xavier Lima, advogado e vice-presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da OAB – GO, sobre a realização do inventário de maneira extrajudicial
Com a implementação da Lei n° 11.441/07, o cenário dos inventários e sucessões de bens no Brasil sofreu uma transformação significativa, impactando tanto a prática jurídica quanto a dinâmica familiar e patrimonial. Esta legislação possibilitou a realização de inventários diretamente nos Cartórios de Notas.
A simplificação do processo de inventário, ao eliminar a necessidade de demandas judiciais, trouxe uma alternativa viável e eficiente para famílias que precisam regularizar sua situação patrimonial após a perda de um ente querido. Com isso, houve uma redução significativa na burocracia e nos custos envolvidos, proporcionando uma solução mais célere e acessível.
A nova dinâmica também impactou positivamente na atuação dos advogados, que passaram a orientar seus clientes na escolha do procedimento mais adequado, considerando a complexidade do inventário e a existência de conflitos entre os herdeiros. A possibilidade de realizar o inventário extrajudicialmente incentivou uma abordagem mais colaborativa e amigável entre os envolvidos, além de contribuir para a mitigação de conflitos familiares.
Para entender melhor sobre esse assunto, o CNB/GO conversou com Marcelo Xavier Lima, advogado e vice-presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da OAB – GO, que esclareceu algumas dúvidas sobre o processo de inventário via extrajudicial, seus benefícios e desafios.
Confira a entrevista na íntegra:
CNB/GO: Como você percebe o impacto do aumento significativo no número de inventários realizados em Cartórios desde a implementação da Lei n° 11.441/07 na prática jurídica?
Marcelo Xavier: De forma muito positiva. Foi um grande avanço não apenas para a sociedade, mas também para o judiciário e a advocacia. É importante destacar que a implementação dessa lei trouxe uma alternativa viável e eficiente para as famílias que necessitam regularizar a situação patrimonial após o falecimento de um ente querido. Ao permitir que o inventário seja realizado diretamente no Cartório de Notas, eliminou-se a necessidade de demandas judiciais. A Lei n° 11.441/07 proporcionou uma redução significativa na burocracia e nos custos envolvidos no procedimento.
Ademais, o processo ficou simplificado e o contato direto do advogado com o serventuário do cartório de notas tornou a prática jurídica muito mais dinâmica e direta, corrigindo pendências de forma muito mais célere, sem a necessidade de esperar por prazos dilatados ou despachos do Juiz, que por vezes, demoram meses para exarar simples decisões interlocutórias e, assim, arrastando o processo por anos. Enquanto isso, na via extrajudicial, pode-se muito bem resolver pendências de um documento no mesmo dia em que é solicitado. Esta simplificação e o curto prazo em que o procedimento é concluído também resultaram no aumento de advogados atuando na área de inventários.
CNB/GO: Em sua opinião, de que maneira essa mudança legislativa influenciou a dinâmica e a eficiência do processo sucessório para os advogados e seus clientes?
Marcelo Xavier: A possibilidade de realizar o inventário de forma extrajudicial trouxe uma alternativa mais ágil e econômica para os clientes. Os advogados agora têm a capacidade de orientar seus clientes na escolha do procedimento mais adequado para o caso específico, levando em consideração fatores como a complexidade do inventário, a existência de conflitos entre os herdeiros e a necessidade de intervenção judicial. Muitos inventários que estavam pendentes de regularização decorriam do temor do homem médio em ingressar com uma ação judicial, pelo alto valor das custas judiciais ou pela conhecida morosidade do judiciário.
Quando o cliente toma conhecimento de que existe uma possibilidade de realizar o inventário sem ser pela via judicial, nos casos onde há concordância entre as partes e todos os herdeiros são maiores e capazes, sendo que, o inventário pode ser realizado na via extrajudicial em um tempo médio de conclusão de apenas 30 a 45 dias e ainda acarretará em economia nos gastos do processo, isso estimulou diversas famílias a resolverem questões patrimoniais pendentes.
Outro ponto importante é que essa mudança legislativa também incentivou uma abordagem mais colaborativa e amigável entre os herdeiros, uma vez que o inventário extrajudicial requer a concordância de todos os envolvidos. Os advogados desempenham um papel fundamental na mediação de acordos e na garantia de que os interesses de seus clientes sejam protegidos durante todo o processo sucessório.
CNB/GO: Qual é a sua análise sobre a economia estimada em R$ 5,6 bilhões resultante da realização de inventários em Cartórios de notas? Como isso se traduz em termos práticos para os envolvidos?
Marcelo Xavier: Quando ocorre a realização de um inventário, os herdeiros terão que pagar dívidas do falecido(a) se houver. Além disso, devem recolher para o Estado o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), cuja alíquota irá variar a depender do valor do patrimônio a ser inventariado, bem como diversas certidões que precisam ser atualizadas.
Além de todos estes gastos, se o inventário for realizado na via judicial, os herdeiros arcarão com as custas judiciais, que no caso do Estado de Goiás possuem valores bem elevados, e com honorários advocatícios mais altos, vez que se tratará de um processo longo e de maior complexidade. Em termos práticos, essa economia se traduz em diversos aspectos positivos para as partes interessadas, seja os herdeiros, advogados, Estado e toda a sociedade.
Primeiramente, a redução significativa nos custos associados ao inventário extrajudicial permite que as famílias preservem uma parte maior do patrimônio deixado pelo falecido, evitando gastos excessivos com taxas e custas judiciais, além de pagarem honorários advocatícios em percentuais menores. Segundo, contribui diretamente para a economia pública, vez que muitas vezes os herdeiros não possuem condições de pagar o ITCMD e as custas judiciais ao mesmo tempo, desistindo de realizarem o inventário e, com isso, o Estado perdia muita arrecadação. Falando em economia, os dados refletem diretamente na vida de todo cidadão.
Um estudo conduzido em 2013, pelo Centro de Pesquisas sobre o Sistema de Justiça brasileiro (CPJus), concluiu que cada processo que entra no Judiciário custa em média R$ 2.369,73 para o contribuinte. Terceiro, para os advogados, se traduziu em aumento da demanda com recebimentos de honorários de forma mais rápida e conclusão célere do processo, abrindo espaço para captarem mais demandas.
Enfim, os benefícios da desjudicialização do inventário trouxeram benefícios incontestáveis e economia para todos os envolvidos.
CNB/GO: Como os custos reduzidos decorrentes da realização de inventários em Cartórios de notas têm sido percebidos pelos clientes? Isso tem impactado na satisfação deles com os serviços jurídicos prestados?
Marcelo Xavier: Com certeza. Muitos imóveis não eram vendidos porque eram objeto de inventários não realizados, impossibilitando a partilha e trazendo diversos conflitos familiares. Com a redução dos custos e a celeridade na conclusão do processo, gerou grande satisfação dos clientes de forma que se tornou frequente e perceptível a indicação de outros para a resolução de inventário pela via extrajudicial.
CNB/GO: Quais são os principais desafios que os advogados enfrentaram ao adaptar-se às mudanças trazidas pela Lei n° 11.441/07?
Marcelo Xavier: Uma das principais dificuldades foi a necessidade de atualização constante sobre os novos procedimentos e requisitos legais estabelecidos pela nova legislação. Os advogados precisaram estudar e compreender as nuances do inventário extrajudicial para garantir que estivessem em conformidade com as novas normas. A transição de um modelo tradicional de inventário judicial para o extrajudicial exigiu uma mudança de paradigma por parte dos advogados. Eles tiveram que se adaptar a uma abordagem mais colaborativa e menos litigiosa, uma vez que o inventário em Cartório requer a concordância de todos os herdeiros.
Assim, os advogados precisaram desenvolver novas habilidades para lidar com os desafios específicos do inventário extrajudicial, como a negociação de acordos entre os herdeiros e a elaboração de documentos adequados para o Cartório de Notas. No entanto, com a simplificação do processo essa adaptação não foi tão difícil.
CNB/GO: Como você avalia a satisfação dos clientes que optaram por realizar inventários em Cartórios de notas? Quais aspectos eles destacam como os mais positivos desse procedimento?
Marcelo Xavier: Primeiramente, é sempre um momento delicado quando se trata de inventário. Muitos ainda nem conseguiram sofrer o luto e precisam resolver a questão patrimonial. Com a assistência do advogado em um processo econômico e célere, os clientes estão cada vez mais optando pela realização do inventário extrajudicial.
Os principais aspectos destacados pelos clientes são: agilidade, pela rapidez com que o inventário é concluído em Cartórios de notas; economia, evitando despesas excessivas com taxas e custas judiciais; facilidade, com procedimento menos burocrático e mais acessível, permitindo que os herdeiros lidem com a documentação de forma mais direta e eficiente. Transparência é outro ponto positivo destacado pelos clientes. Eles apreciam a clareza e a objetividade do procedimento, bem como a comunicação direta entre o Cartório e seus advogados. Por fim, a mitigação de conflitos, pois muitos clientes destacam que o inventário em Cartório contribui para a redução de conflitos entre os herdeiros.
CNB/GO: Houve uma mudança significativa na demanda por serviços jurídicos na área sucessória após a implementação da Lei n° 11.441/07? Se sim, de que maneira isso impactou a atuação dos advogados nesse campo?
Marcelo Xavier: Certamente. Houve um aumento significativo na procura por inventários na via extrajudicial e regularização dos imóveis objetos do inventário. Isso impactou em maior procura dos advogados por especialização na área, vez que, altamente rentável e célere, exigindo ainda capacitação para negociação e conciliação das partes.
CNB/GO: Como você vê o futuro dessa prática de realização de inventários em Cartórios de notas? Há perspectivas de novas mudanças legislativas ou aprimoramentos que possam influenciar ainda mais a dinâmica do processo sucessório?
Marcelo Xavier: Acredito que a tendência atual é a da desjudicialização. Hoje, além dos inventários temos a adjudicação compulsória e a usucapião extrajudicial. Tenho convicção de que, com a disseminação de informação, o número de inventários pendentes será bastante reduzido e a demanda extrajudicial continuará crescendo.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sempre tem implementado novas ferramentas para tornar ainda mais célere e efetivos os inventários nos cartórios de notas. Hoje, por exemplo, o inventariante pode ser nomeado por escritura pública no Cartório de Notas e agilizar o levantamento de bens e dívidas do de cujus. De igual forma, os Estados têm desenvolvido ferramentas para que a avaliação de bens e a emissão de guia de pagamento do ITCMD seja bem rápida.
No Estado de Goiás, por exemplo, a avaliação e emissão da guia de pagamento demoravam em média 90 dias. Com a implementação em 2023 do ITCD Web 3.0, isso ocorre no mesmo dia do lançamento no sistema pelo usuário, o que facilita o início do processo de inventário no Cartório de Notas.
Um ponto a ser observado atualmente e que merece aprimoramento é a partilha de direitos possessórios sobre imóveis que não estão devidamente escriturados. Apesar de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitirem a partilha dos referidos direitos, ainda há óbices por parte de Cartórios de Notas e de Registro de Imóveis em registrar os inventários. Acredito que em pouco tempo isso também será simplificado.
Em relação às mudanças legislativas, destaco o Projeto de Lei 606/2022 de autoria do Deputado Federal Célio Silveira (MDB-GO), que tem por objetivo permitir o inventário na via extrajudicial mesmo quando houver a existência de testamento e interesses de menores e incapazes. Segundo a proposta, no caso de haver interessado menor ou incapaz, o juiz poderá conceder alvará para que o inventário e partilha sejam feitos por escritura pública, após manifestação do Ministério Público, desde que: a partilha seja estabelecida de forma igualitária sobre todo o patrimônio herdado; os interessados todos concordem; seja apresentada a minuta final da escritura, acompanhada da documentação pertinente.
O projeto está em tramitação e, se aprovado, será um passo gigantesco para desafogar ainda mais o judiciário e implicará em um número ainda maior de inventários pela via extrajudicial. Advogados devem ficar atentos.
CNB/GO: Qual a importância dos serviços realizados pelos cartórios de notas em relação a inventários e sucessões de bens?
Marcelo Xavier: Considero de suma importância os serviços prestados pelos Cartórios de Notas. Eles oferecem uma alternativa ágil e eficiente para a realização dos inventários, contribuindo com o deslinde de conflitos familiares e patrimoniais de forma rápida. O aumento no número de inventários realizados em Cartórios também teve um impacto positivo na descongestão do Poder Judiciário.
Com a possibilidade de realizar o inventário extrajudicialmente, muitos processos que antes sobrecarregavam o sistema judicial puderam ser transferidos para os Cartórios, liberando recursos e agilizando o andamento de outras demandas. Além de descongestionarem o Judiciário, os cartórios de notas trazem segurança jurídica aos cidadãos na realização de procedimentos antes tão caros, morosos e complexos, além da grande economia traduzida na cifra de R$ 5,6 bilhões de reais, evitando a judicialização de mais de 2,3 milhões de inventários. É extraordinário.
Fonte: Assessoria de comunicação do CNB/GO.