Em plenário virtual realizado na segunda-feira (14), o Supremo Tribunal Federal – STF negou o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas para divisão de pensão por morte. O julgamento foi concluído com os votos dos ministros Luiz Fux e Nunes Marques, que viraram o placar.
Por 6 votos a 5, a maioria da Corte foi contrária ao reconhecimento de duas uniões estáveis simultâneas para rateio de pensão, fixando a seguinte tese: “A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, §1º do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro”.
O julgamento havia sido interrompido por um pedido de vista do até então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em setembro de 2019, quando o placar estava em 5 a 3 votos a favor da divisão da pensão.
O caso concreto diz respeito a um homem que, ao menos por 12 anos, manteve dois relacionamentos em simultâneo: um com uma mulher e outro com um homem. Após a morte dele, a mulher conseguiu o reconhecimento da união estável e passou a receber a pensão por morte. O segundo companheiro então pleiteou na Justiça a divisão do benefício, alegando que também tinha união estável paralela com o falecido.
Contra a divisão votaram os ministros Luiz Fux, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. Se pronunciaram a favor Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello e Luís Roberto Barroso.
Analogia com bigamia não cabe ao caso
A advogada Luciana Brasileiro, autora do livro “Famílias Simultâneas e o seu Regime Jurídico” e vice-presidente da Comissão de Direito de Família e Arte do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, pondera sobre os efeitos da decisão..
“A decisão comete um grave equívoco ao usar a analogia da bigamia para a união estável. É uma decisão que afeta negativamente inúmeras pessoas vulneráveis financeiramente, sobretudo mulheres, que são a maioria das dependentes dos companheiros em casos de famílias simultâneas”, disse.
Para ela, a decisão foi pautada por questões culturais, e ignora o “dever do Supremo de interpretar a Constituição Federal à luz da dignidade da pessoa humana”.
Lucina reflete:“É uma decisão que desprotege, retirando do Estado o ônus que lhe cabe por força do artigo 226, § 8.º da Constituição Federal. Embora a decisão tenha cunho meramente previdenciário, é um grande retrocesso, porque não enxerga o critério de dependência econômica do direito previdenciário”.
José Fernando Simão, diretor nacional do IBDFAM, avalia que a decisão “é um verdadeiro alento”. Ele expõe: “A partir da decisão do STF temos claramente uma situação de emancipação dos terceiros ou terceiras que optam, pela cabeça ou pelo coração, por uma relação afetiva com terceiro/terceira que já tem união estável ou casamento e depois pretendem receber efeitos jurídicos dessa relação”.
E ressalta: “melhor fica o Direito Civil ao deixar os – imprópria e preconceituosamente denominados – ‘amantes’ fora do conceito de família. Sejam felizes sim, mas sem buscar a tutela do Estado. Vivam intensamente e sem preconceitos ou peias, pois assim permite a liberdade, porém, sem buscar efeitos jurídicos do Direito de Família”, diz.
IBDFAM aponta uso inadequado de termos que comprometem a compreensão dos fatos
Em nota divulgada nesta quinta-feira (16), o IBDFAM apontou o uso de termos inadequados em notícias do julgamento do STF sobre uniões simultâneas. O Instituto ressaltou que o uso dos termos “amante” e “direito da amante” mostra-se totalmente incabível ao se reportar os fatos do aludido julgamento. O texto frisa que o uso da palavra “amante” contém alta carga de preconceito social e, empregada nesse contexto, expressa estigmas que provocam reações hostis e contribui para a depreciação das mulheres. Leia na íntegra.
Fonte: IBDFAM