Em matéria de Direito Tributário, o ano de 2023 foi marcado pela aprovação da reforma tributária (PEC 45/2019) em 15 de dezembro, tendo sua promulgação sido feita em 20 de dezembro de 2023 como Emenda Constitucional nº 132, após aprovação em dois turnos pela Câmara dos Deputados.
Após entrar em vigor, a reforma contará com um período de adaptação gradativo, estimado para os próximos anos e se estendendo até 2033, quando estará apta a exercer todos os seus efeitos de maneira plena e estável.
Contudo, os efeitos da reforma tributária são sabidamente interdisciplinares e afetam outras áreas do direito, como o Direito Civil, Empresarial e Sucessório, aumentando, portanto, a complexidade do processo de adaptação das novas regras.
Quando falamos em reforma tributária, há uma gama de assuntos os quais se relacionam entre si e ligam-se à reforma, sendo diretamente afetados por ela, como por exemplo o planejamento patrimonial e o planejamento sucessório, dois tópicos do direito amplamente debatidos na atualidade e que se fazem cada vez mais presentes na organização de vida das pessoas.
Apesar de serem institutos diferentes, na grande maioria das vezes o planejamento patrimonial e o planejamento sucessório andam juntos, uma vez que ao planejar a sucessão, automaticamente planeja-se seu patrimônio, o que não ocorre necessariamente no caso contrário, já que o planejamento patrimonial é mais amplo e abrange outras áreas da vida do indivíduo.
A seguir, estudaremos o porquê 2024 é um ano estratégico para as pessoas que têm interesse em planejar seu patrimônio da melhor forma possível agirem em prol da organização, evitando a onerosidade e a complexidade que a reforma tributária vem trazendo através do sistema tributário nos próximos anos.
Algumas mudanças trazidas pela Emenda Constitucional 132
Primeiramente, se faz necessário relembrar algumas mudanças relevantes trazidas pela Emenda Constitucional nº 132 de 2023. Em termos de planejamento, seja sucessório ou patrimonial, a reforma tributária trouxe algumas modificações importantes em relação ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), modificando o artigo 155 da Constituição e instituindo:
1. Progressividade de alíquota:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;
§1º O imposto previsto no inciso I:
…
VI – será progressivo em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação;
O novo texto trazido pela Emenda Constitucional 132/2023 obriga os estados que utilizam a alíquota fixa a modificar seu sistema para cobrar o imposto de forma progressiva, observando o teto e o piso que serão definidos por legislação complementar em momento oportuno pelos estados e pela federação, conforme definido pela EC.
2. Competência tributária:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; (…)
§1º O imposto previsto no inciso I:
I – relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal;
II – relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde era domiciliado o de cujus, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal;
Ainda em relação ao artigo 155 da Constituição, a Emenda Constitucional n. 132 limitou a competência para cobrança de impostos sobre as Transmissões Causa Mortis e Doações, sendo agora de competência do estado de situação do bem quando se tratar de bens imóveis e do estado de domicílio do de cujus ou doador em caso de bens móveis, títulos e créditos.
Princípio da anterioridade tributária
Após relembrarmos as duas principais mudanças trazidas pela reforma que mais geram impacto em questões de planejamento patrimonial, é importante falarmos um pouco sobre um princípio muito importante no direito tributário: o Princípio da Anterioridade Tributária, previsto no artiogo 150 da Constituição.
De acordo com os ensinamentos de Luis Eduardo Schoueri (2023), “princípio da Anterioridade impõe a existência de um prazo entre a lei que institui ou aumenta um tributo e o início de sua vigência”.
O princípio da anterioridade é dividido em duas categorias: o genérico, ou anual, que institui que o fisco não poderá cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; e o nonagesimal, que dá um prazo de noventa dias da publicação da lei que instituiu ou aumentou os impostos para que estes sejam cobrados. Schoueri (2023), explica que:
(…) em regra, para que um tributo seja exigido em 1º de janeiro de um ano, deverá a lei que o instituiu ter sido publicada até o dia 3 de outubro do ano anterior, i.e., 90 dias antes do dia 1º de janeiro. Nada impede que seja a lei editada em 31 de dezembro. Afastar-se-á, entretanto, a data de 1º de janeiro, cobrando-se o tributo no ano seguinte, apenas com 90 dias contados da publicação.
No caso da reforma tributária, mais especificamente se tratando do ITCMD, ambos os princípios podem — e devem — ser aplicados, visando evitar uma possível surpresa ao contribuinte diante de uma cobrança de imposto inesperada.
Falta de legislação complementar
Unindo-se ao princípio da anterioridade, ainda destaca-se a ausência de legislação complementar por parte dos estados. A reforma tributária foi aprovada e promulgada de tal forma que gerou receio na maioria dos brasileiros.
A verdade é que, para aqueles que visam estratégias de planejamento patrimonial, a melhor delas é agir em 2024. Isso porque ainda não existem legislações complementares para que a instituição dos novos impostos seja feita e, por se tratar de um processo um pouco mais complexo, o prazo para que as leis sejam encaminhadas para análise é mais longo, permitindo que o ano de 2024 seja decisivo em termos de planejamento, já que as leis provavelmente somente serão aprovadas no final do ano.
De acordo com o artigo 18, inciso II da Emenda Constitucional n. 132/2023, o Poder Executivo tem um prazo de 180 dias para enviar os projetos de Lei Complementar referidos na EC nº 132 para que sejam devidamente analisados.
Diante disso, podemos concluir que 2024 é um ano seguro mas extremamente decisivo para aqueles que querem se planejar visando evitar a onerosidade e complexidade que surgirão nos próximos anos a partir da reforma tributária.
Os impactos da reforma, principalmente no que tange ao ITCMD, matéria de maior foco na reforma pelo viés patrimonial, podem ser estrategicamente driblados em 2024, principalmente contando com o auxílio de profissionais qualificados e que dominam o Planejamento Patrimonial e Sucessório.
Referências
SCHOUERI, Luís E. Direito tributário. [Digite o Local da Editora]: Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553626041. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553626041/. Acesso em: 25 mar. 2024.
Fonte: ConJur