Na contramão do movimento nacional, o número de registro em cartório de uniões estáveis entre casais LGBT no estado de Goiás caiu 19,4% entre 2019 e 2021. No cenário brasileiro, as uniões estáveis cresceram 60% nos últimos 10 anos.
A união estável entre casais LGBT foi reconhecida como entidade familiar pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011 e dez anos depois os cartórios de notas observam queda na opção pela formalização em Goiás.
Segundo dados do Colégio Notarial do Brasil (CNB), no ano de 2019 foram formalizadas 72 uniões homoafetivas, passando para 64 registros em cartório no ano seguinte e fechando 2021 com 58 uniões estáveis entre casais LGBT.
Há diversos fatores que podem ter influenciado no decréscimo das uniões estáveis no estado. Conforme Maria Berenice Dias, presidente da Comissão Nacional de Direito Homoafetivo e Gênero do Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFAM) e vice-presidente do instituto, um dos motivos foi a pandemia de Covid-19.
“Não tem nenhuma justificativa Goiás haver um decréscimo no número que eventualmente chame atenção. Mas existe um fator, que é a questão da pandemia e que acabou restringindo um pouco a saída das pessoas de casa, as pessoas irem a cartórios, e talvez seja isso que tenha acontecido para este número mais restrito”, afirma Dias.
Maria Berenice também atribui à queda de união estável entre casais LGBT nos cartórios por conta da opção de formalização da relação por meio de documentos particulares.
“Essa formalização também pode ser feita por documento particular, com um contrato firmado entre ambos dizendo que vivem em união estável”, aponta.
Por outro lado, a presidente da comissão aponta o crescimento nos casamentos homoafetivos e acredita que há um movimento de informação maior no estado de Goiás sobre direitos da família e de gênero, fazendo com que os casais do mesmo sexo optem pelo casamento.
Dias ainda avalia que o aumento nacional se deu em decorrência do avanço do combate ao preconceito sexual e de gênero no Brasil, principalmente após o reconhecimento da união estável entre casais do mesmo sexo pelo STF.
“Este aumento generalizado decorre muito da aceitação da sociedade e da família com relação a esses vínculos que sempre foram muito estigmatizados. Mas a partir de 2011, quando o Supremo Tribunal Federal reconheceu as uniões homoafetivas como entidade familiar e assegurou o direito ao casamento, as pessoas têm buscado mais as formalizações”, disse Maria Berenice.
Importância da união estável
Assim como o casamento, a união estável é reconhecida como entidade familiar. Ela consiste na relação entre duas pessoas, caracterizando-se como uma convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição familiar, não havendo a necessidade de que o casal resida na mesma habitação para que o vínculo seja configurado e, sem prazo mínimo de convivência.
Portanto, as partes têm os mesmos direitos e deveres previstos no casamento, como: fidelidade recíproca; vida em comum; mútua assistência; sustento; guarda e educação dos filhos e respeito e consideração mútuos.
Até mesmo em relação ao regime de bens a união estável tem como padrão o regime de comunhão parcial, que é o mais aplicado aos matrimônios no Brasil, sendo necessária a formalização em cartório para que seja estipulado um regime diverso, equivalente ao pacto antenupcial celebrado no casamento. O regime de bens impactará diretamente na forma como será feita eventual partilha no caso de término da união estável.
A formalização da união estável facilita a comprovação da união perante terceiros, garantindo além da partilha dos bens adquiridos na constância da união, todos os direitos sucessórios e previdenciários em caso de falecimento, bem como a inclusão de dependentes em planos de saúde, seguros de vida, entre outros.
“O mais significativo é que os vínculos homoafetivos, cuja visibilidade e prova é ainda mais difícil por conta do preconceito social, é fundamental terem uma documentação. Em caso de separação ou de morte, por exemplo, há uma tendência da família do falecido de negar a existência da união. A prova da união, às vezes, é complicada porque os vizinhos não se dispõem a prestar depoimento, pode não ter fotos juntos em eventos que mostrem a existência da união. É importante ter uma manifestação de vontade escrita, isso é fundamental para assegurar os direitos”, afirma a presidente da comissão de direito homoafetivo.