Na busca pela solução pacífica dos conflitos relacionados às ocupações do Estado de Goiás, a Comissão de Conflitos Fundiários (CCF) realizou vistoria na Ocupação Paulo Freire, nesta terça-feira (02/05), em Goiânia. A Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO) é integrante da comissão e participou por meio do seu Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH) e de sua Ouvidoria-Geral, junto com o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) e representantes de movimentos sociais. A comunidade possui 100 famílias, com cerca de 300 moradores, e está localizada no bairro Solar Ville.
“A CCF parte da ideia de que não é possível julgar ou decidir de dentro do gabinete sem conhecer a realidade das pessoas”, explicou o defensor público Gustavo Alves de Jesus, colaborador do NUDH. “Então, trazer os órgãos do sistema de justiça e o Poder Público para conhecer essas comunidades e afastar preconceitos, pode facilitar o processo de mediação dos conflitos”.
Juliana Pereira de Freitas, coordenadora da Ocupação Paulo Freire, mora com seu marido na área desde a sua instalação, no dia 28 de agosto de 2022. “Nós montamos nossas barracas em um terreno do Município de Goiânia, aqui do lado. Mas no dia 1º de setembro eles vieram com a patrola e destruíram tudo”, contou. Por isso, a comunidade se instalou em um terreno vizinho, uma propriedade particular abandonada.
Juliana narrou que as primeiras famílias se organizaram para mudar para a região durante a pandemia. “Viemos na época mais difícil, não tínhamos nem o que comer, e o pouco que tínhamos perdemos durante o despejo da prefeitura, que patrolou nossas coisas”.
“Esta área era só mato e lixo, não tinha nada. Estava abandonada há muitos anos. Nós limpamos tudo. Somos só famílias procurando uma moradia para criar nossos filhos”, explicou a coordenadora. “Agora, aqui é muito bom. As crianças estão estudando, nós abrimos nossa marcenaria, é muito tranquilo”.
Com seis filhos e grávida de mais uma, Rayssa Stefany Estevão Brasil, de 28 anos, chegou à comunidade com dívidas da casa onde morava de aluguel. Por não receber ajuda do pai das crianças e sem ter com quem deixá-los, ela não consegue emprego. “Eu tive que dar minha televisão para pagar parte do valor que devia”, relatou. “Quando cheguei, eu não tinha nada e a comunidade me ajudou a arrumar minha barraca”.
Ali, Rayssa se sentiu acolhida e se agarrou à esperança de ter o seu direito à moradia respeitado. “Eu não quero sair. Aqui eu sou feliz, meus filhos gostam e estudam perto”, informou. “Minha casa é tudo pra mim e eu vou lutar para ficar”.
Direito à Moradia
A ouvidora-geral da DPE-GO, Ângela Cristina, informou que a visita da comissão é importante para que a comunidade entenda seu fluxo de trabalho e a possibilidade de mediação com as partes. “As famílias estão super apreensivas com o receio de um despejo mas, ao mesmo tempo, a Defensoria Pública está se colocando à disposição para acompanhar e ser essa ponte para a mediação”, afirmou.
O juiz auxiliar da presidência do TJ-GO, Reinaldo de Oliveira Dutra, informou que será realizada uma mediação com a comunidade, o proprietário e o Município de Goiânia. A atividade será acompanhada pelo Tribunal de Justiça, pela Defensoria Pública e pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO).
“Será uma mediação muito qualificada, porque o conflito é complexo e nós precisamos construir uma solução adequada, para que vocês tenham acesso à moradia e possam conseguir sobreviver de forma digna”, contou o juiz aos moradores da Ocupação Paulo Freire. “Uma coisa vocês podem ter certeza, a Comissão está aqui para auxiliar na construção desta solução. Vocês não estão sozinhos”, garantiu.
Reinaldo Dutra reforçou que é importante que cada integrante da comunidade esteja devidamente representado por um advogado e, caso não estejam, que busquem a Defensoria Pública. Isto porque, apesar do trabalho de mediação da CCF, existe um processo judicial em andamento.
Gustavo Alves de Jesus ressaltou que a DPE-GO buscará alternativas que sejam viáveis para resguardar ao máximo os direitos das famílias. “É preciso ver que não se tratam de criminosos, vândalos ou baderneiros, mas, sim, de pessoas que passaram por dificuldades na vida e têm, nesse espaço, a única perspectiva de qualidade de moradia, para poder criar os filhos com o mínimo de transtornos possíveis”.
A Comissão de Conflitos Fundiários foi criada pelo TJ-GO, em cumprimento à determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), e tem o NUDH como participante, com o objetivo de promover a paz social e buscar soluções consensuais para os conflitos fundiários. O trabalho da CCF é realizar inspeções e audiências de mediação antes de qualquer decisão para despejo, mesmo em locais em que já exista decisões que determinem a desocupação.
Fonte: Defensoria Pública de Goiás
Link: http://www2.defensoria.go.def.br/noticias/detalhes/4153