Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão
DESERDAR UM HERDEIRO NÃO É TÃO FÁCIL MAS É POSSÍVEL, como indica a inteligência do artigo 1.961 e seguintes do Código Civil. A DESERDAÇÃO como se verá se dá por TESTAMENTO – qualquer deles – e é necessário que um processo judicial (Ação de Deserdação) seja proposta dentro de 04 (QUATRO) anos a contar da abertura do TESTAMENTO, cf. regras do CCB:
“Art. 1.961. Os herdeiros necessários podem ser privados de sua legítima, ou deserdados, em todos os casos em que podem ser excluídos da sucessão.
(…)
Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação, incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.
Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo de quatro anos, a contar da data da abertura do testamento”.
O Mestre LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO (Direito das Sucessões. 2019) elenca os pressupostos para a deserdação:
1. A existência de HERDEIROS NECESSÁRIOS (e devemos lembrar que esses são aqueles do art. 1.845 – descendentes, os ascendentes e o cônjuge/companheiro);
2. Um testamento existente, válido e eficaz, contendo a CLÁUSULA DE DESERDAÇÃO (art. 1.964, parte final);
3. A expressa declaração da CAUSA, dentre as previstas na Lei (art. 1.814, 1.962 e 1.963);
4. A propositura da AÇÃO DE DESERDAÇÃO dentro do prazo legal decadencial com pedido, no final, julgado PROCEDENTE (art. 1.965, par. único)”
O brilhante doutrinador relembra, oportunamente, que não se deve confundir DESERDAÇÃO com INDIGNIDADE embora possam parecer muito semelhantes dado o seu objetivo:
” (…) A deserdação sempre se inicia mediante DECLARAÇÃO DE VONTADE do autor da herança, através de CLÁUSULA TESTAMENTÁRIA deserdatória, sendo dirigida a alcançar exclusivamente os HERDEIROS NECESSÁRIOS, ao contrário do que ocorre com a INDIGNIDADE, que opera ‘ex lege’ e abrange TODOS OS SUCESSORES do hereditando, sejam eles herdeiros legais (necessários ou facultativos), herdeiros TESTAMENTÁRIOS ou LEGATÁRIOS, embora ambas, repisamos, devam ser confirmadas por SENTENÇA JUDICIAL “.
POR TUDO que foi visto, importantíssimo se mostra não apenas a VONTADE DE DESERDAR mas efetivamente trilhar o caminho correto do procedimento, observando as FORMALIDADES da Lei (especialmente a JUSTA CAUSA, assim definida no Código Civil) para que o resultado pretendido seja de fato obtido depois do falecimento do autor da herança, operando-se, assim, a verdadeira JUSTIÇA buscada para o caso concreto:
“TJRJ. 00005779420178190060. J. em: 30/07/2020. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESERDAÇÃO. NECESSIDADE DE PROPOSITURA DE AÇÃO PRÓPRIA, NÃO SENDO SUFICIENTE A MERA DECLARAÇÃO EM TESTAMENTO. (…) INEXISTÊNCIA DE JUSTIFICATIVA PARA A DESERDAÇÃO. (…). 5. Quanto ao mérito: é necessário analisar se os réus praticaram algum ato ou omissão (DESAMPARO) e se esta ação ou omissão justificam a DESERDAÇÃO requerida. 6. Não se discute, eis que restou incontroverso nos autos, que os réus NÃO VISITARAM O PAI ao tempo de sua doença, fato este que não foi por eles negado. 7. De acordo com o disposto no artigo 1.962, inciso IV, do Código Civil, o desamparo do ascendente em grave enfermidade autoriza a deserdação. 8. Contudo, impõe-se considerar que tal fato adrede mencionado (as ausências de visitas por parte dos filhos), por si só, NÃO ENSEJA A DESERDAÇÃO na medida em que o relacionamento familiar era ALTAMENTE CONTURBADO, distanciando-se do MODELO DE FAMÍLIA por todos idealizada, existindo ao longo dos anos diversas investidas do genitor em desfavor dos filhos e da ex-esposa, com agressões, ameaças e processos judiciais, ocasionando, assim, o afastamento do núcleo familiar e a consequente RUPTURA na relação de reciprocidade. 9. Ademais, diferente do que alega a autora, não há comprovação da notícia aos filhos da GRAVE ENFERMIDADE pela qual o de cujus experimentou, até mesmo porque quem deu causa a ruptura do vínculo familiar fora O PRÓPRIO GENITOR. 10. Quanto ao DESAMPARO MATERIAL, diante da vasta documentação acostada aos autos e das próprias alegações da autora, fica evidente que o de cujus não era desprovido de meios financeiros, tendo ele sido atendido e internado em excelentes hospitais particulares, que possuem elevados custos, de forma que, nenhum recurso financeiro ou material lhe faltou em vida. 11. Do mesmo modo, as provas trazidas aos autos denotam que tampouco houve DESAMPARO AFETIVO/EMOCIONAL, considerando que durante o tempo em que sofreu com grave enfermidade o falecido recebeu apoio moral e psicológico de amigos e de sua então companheira, que ora busca se aproveitar da deserdação inserida no testamento. 12. Assim, o que se depreende do mosaico probatório, é que o falecido não restou desprovido de cuidados na fase final da vida, razão pela qual, a sentença prolatada revela-se escorreita, não merecendo qualquer tipo de retoque, já que ausentes os elementos necessários para autorização da deserdação. APELO QUE DEVE SER CONHECIDO E DESPROVIDO”.
Fonte: Jornal Contábil