Presidente da Comissão de Notários e Registradores do IBDFAM/GO, Igor França Guedes, avaliou o trabalho dos Cartórios de Notas no Estado de Goiás
Em entrevista ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Goiás (CNB/GO), o presidente da Comissão de Notários e Registradores do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM/GO), Igor França Guedes, abordou o papel da instituição no Direito das Famílias e das Sucessões, a atuação dos cartórios nas práticas do Direito Civil, e movimento de desjudicialização no País.
Leia a entrevista na íntegra.
CNB/GO – Quais são suas metas à frente da gestão da Comissão de Notários e Registradores do IBDFAM/GO?
Igor França – A minha principal meta à frente da Comissão é difundir informação e conhecimento a respeito dos serviços notariais e de registro, para deixar evidente a importância desses serviços na concretização de direitos, em especial, aqueles relacionados ao Direito de Família e Sucessões, que é o objeto de estudo do Instituto.
CNB/GO – Como foi a adaptação do Instituto em meio à pandemia de coronavírus?
Igor França – Acredito que foi bastante desafiador para toda a sociedade. Não foi diferente para o Instituto. Mas conseguimos utilizar os instrumentos de tecnologia para promover encontros e discussões, o que se mostrou bastante proveitoso. O uso da tecnologia para a realização de reuniões e difusão do conhecimento será um legado importante a ser deixado pela pandemia.
CNB/GO – Qual o papel do IBDFAM no Direito das Famílias e das Sucessões?
Igor França – O Instituto foi criado para construir um Direito de Família capaz de atender as demandas de uma sociedade que se transforma a cada dia. Para isso, promove debates e discussões em toda a sociedade visando transformar o pensamento jurídico sobre o tema e contribuir para as reflexões a respeito do conceito de família e seus reflexos jurídicos. O Instituto atua propondo Projetos de Lei, Emendas Constitucionais, além de atuar como amicus curiae [amigo da corte] em diversas ações no âmbito da jurisdição constitucional, junto ao Supremo Tribunal Federal. O Divórcio Direto, a criação do Estatuto das Famílias, a reforma do Direito das Sucessões, o Estatuto da Diversidade Sexual e de Gênero, a União Estável Homoafetiva, a alteração do nome por transexuais e a criminalização de todas as formas de homofobia e transfobia, são alguns dos temas que demandaram forte atuação da entidade.
CNB/GO – O Direito de Família é uma das áreas que mais têm sofrido mudanças nos últimos anos. O casamento homoafetivo, a paternidade socioafetiva, a mudança de nome e sexo direto em cartório. Como avalia as recentes mudanças neste ramo do Direito nos últimos anos?
Igor França – Avalio de forma bastante positiva, pois consigo perceber que essas soluções jurídicas são resultado de amplas discussões e do amadurecimento da comunidade jurídica brasileira, em especial, dos órgãos julgadores, que passaram, gradativamente, a adotar novas visões sobre fenômenos sociais concretos que se apresentam na sociedade e que clamam por proteção. Penso que à medida em que o Poder Judiciário reconhece novos direitos, como esses que foram citados, está garantindo a liberdade das pessoas e acrescentando conteúdo ao princípio da dignidade humana.
CNB/GO – Ainda está em discussão, em âmbito administrativo, a possibilidade de escritura de famílias poliafetivas. Como vê esta nova forma de relacionamento e seu impacto no Direito?
Igor França – Eu penso que precisamos ter um olhar livre de censuras e preconceitos para analisar esses fenômenos sociais. A realidade posta é um dado inexorável e o Direito precisa se transformar para proteger todas essas situações. Nesse contexto, o movimento de Constitucionalização do Direito Civil trouxe marcante contribuição, pois permitiu ressignificar o conceito de família e ampliar o seu alcance sobre essas novas situações. Portanto, o Direito precisa estar à altura do seu tempo, sob pena de se tornar anacrônico.
CNB/GO – Qual a importância da escritura pública de união estável para os conviventes?
Igor França – A comprovação da união estável não é muito simples, pois se configura na convivência pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituição de família. Nesse aspecto, a lavratura da escritura de união estável tem importância fundamental por cumprir essa função de prova, na medida em que constitui um documento revestido de fé-pública, no qual se materializa a manifestação de vontade dos declarantes. Na escritura de união estável é possível declarar a data de início da união estável, regime de bens e alterações do nome. Assim, garante direitos junto ao INSS, convênios médicos, odontológicos, sucessórios e tantos outros. Perceba que os reflexos são amplos.
CNB/GO – Existe um grande movimento de desjudicialização no País. Como avalia essa tendência?
Igor França – Essa tendência é bastante positiva. Entendo o movimento de desjudicialização como uma estratégia desenvolvida para permitir a colaboração de novos atores na prestação de serviços visando à pacificação social, sem prejuízo da prerrogativa do Poder Judiciário para dar a última palavra. Abre-se a via administrativa para que a sociedade disponha de mecanismos alternativos para a declaração ou o reconhecimento de direitos. As iniciativas têm sido exitosas, especialmente quando a abertura está direcionada aos serviços extrajudiciais. Esses serviços participam ativamente do processo de modernização da Justiça brasileira, uma vez que estão adquirindo, gradativamente, atribuições específicas para conhecer sobre determinadas matérias, que até pouco tempo eram de exclusiva competência do Poder Judiciário. Não se trata de absorção de competência, mas da simples criação de mais uma alternativa, agora, na via administrativa, que está sendo facultada aos cidadãos. Podemos citar diversos exemplos importantes nesse sentido: a) os procedimentos de retificação administrativa de área; b) a execução de créditos concedidos para a aquisição de imóveis, prevista na Lei de Alienação Fiduciária; c) os inventários, divórcios, separações e partilhas; d) o protesto das certidões de dívida ativa (CDA); e) o reconhecimento da usucapião extrajudicial; f) a possibilidade de notários e registradores atuarem como mediadores ou conciliadores, conforme Provimento n. 67/2018, do Conselho Nacional de Justiça.
CNB/GO – Com a pandemia, novas normas foram editadas relativas aos serviços dos Cartórios, e hoje uma série de atos podem ser feitos eletronicamente, como divórcios, compra e venda de imóveis, testamentos, entre outros. Como avalia este movimento de migração dos serviços dos cartórios para o meio eletrônico?
Igor França – Esse movimento foi surpreendente e acredito que será um legado importante desse período da pandemia, em se tratando de serviços notariais e de registro. Os serviços extrajudiciais mostraram que estão capacitados tecnologicamente para atender a sociedade em qualquer circunstância, mesmo em situações de pandemia, com restrição de deslocamento das pessoas. Acredito passamos a um novo patamar negocial, a partir do uso dessas tecnologias.
CNB/GO – Qual a importância da atuação dos cartórios nas práticas do Direito Civil?
Igor França – Os serviços notariais e de registro são definidos em lei como organizações técnico-administrativas destinadas a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos. Em outras palavras, é possível afirmar que os cartórios são verdadeiros centros técnicos de aplicação e exercício prático do Direito Civil. Ocorre, nos cartórios, a formatação dos mais complexos e sofisticados negócios jurídicos, cuja orientação é muito bem prestada pelos Tabeliães de Notas. A constituição, transmissão e extinção de direitos reais sobre imóveis, assim como a sua publicidade, são possíveis a partir dos serviços prestados pelos Oficiais de Registro de Imóveis. Os atos de protesto de títulos são fundamentais à cobrança de créditos, trabalho realizado pelos Tabeliães de Protesto. A expedição de certidões de nascimento e óbito, essenciais ao exercício da cidadania e comprovação do fim da personalidade civil das pessoas, é um serviço que depende da atuação do Oficiais de Registro Civil. O depósito, guarda e conservação de determinados documentos são muito bem desenvolvidos pelos Oficiais de Registro de Títulos e Documentos. Percebe-se que os cartórios são importantes centros técnicos de auxílio do cidadão na garantia dos mais diversos interesses privados.
CNB/GO – Como avalia o trabalho dos Cartórios de Notas no Estado de Goiás?
Igor França – Posso afirmar que o Estado de Goiás possui tabeliães de extrema competência e preparo técnico. Extremamente preocupados com a qualidade e modernização dos serviços que prestam. Os serviços prestados em Goiás podem ser comparáveis aos cartórios dos maiores centros do país.
