Conrado Paulino da Rosa, especialista em Direito da Família, conversa com o CNB/GO sobre a divisão de bens após falecimento de parceiros com mais de 70 anos de idade
A divisão de bens após o falecimento de um companheiro é um assunto de grande relevância e complexidade no contexto legal. Em primeiro lugar, a análise começa pelo regime de bens que estava em vigor entre o casal no momento do óbito. O Código Civil estabelece que o viúvo ou a viúva terá direitos na herança conforme o regime de bens que regia o casamento ou a união estável. Este é um ponto crucial a ser considerado, pois diferentes regimes de bens determinam diferentes formas de divisão de patrimônio.
Além disso, o cenário se torna mais complexo quando um dos parceiros tem mais de 70 anos. O Código Civil impõe, em certas situações, o regime de separação obrigatória aos cônjuges nessa faixa etária. Isso também se aplica à união estável, conforme jurisprudência estabelecida pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Nesse contexto, o viúvo ou a viúva terá direito à meação dos bens adquiridos onerosamente, mas essa reivindicação pode ser contestada com base no entendimento do STJ de que é necessário demonstrar a existência de esforço comum para ter direitos hereditários, especialmente quando há descendentes envolvidos.
Quando surgem conflitos entre herdeiros e um cônjuge sobrevivente em relação à partilha de bens, os desafios legais se multiplicam. Conrado Paulino da Rosa, advogado especialista em Direito da Família, argumenta que tal imposição é questionável, uma vez que a idade avançada não é necessariamente indicativa de limitações cognitivas, e privar alguém de escolher seu regime de bens nesse estágio da vida pode ser considerado inconstitucional.
Em resumo, a divisão de bens após a morte de um companheiro envolve uma série de considerações legais e constitucionais complexas, que continuam sendo objeto de debate e análise nos tribunais brasileiros. Confira a entrevista na integra:
CNB/GO – Quais são os principais pontos de discussão quando se trata da divisão de bens após o falecimento de um companheiro?
Conrado Paulino da Rosa: Um ponto essencial é a verificação do regime de bens vigente entre o casal no momento da morte de um dos parceiros. Isso porque, de acordo com o Código Civil, o critério de participação do viúvo na herança, em conjunto com os descendentes, é por ele determinado.
CNB/GO – Como funcionam as regras de divisão de bens em casos de união estável ou casamento quando um dos parceiros tem mais de 70 anos?
Conrado Paulino da Rosa: O Código Civil estabelece, no inciso II do artigo 1.641, a imposição do regime de separação obrigatória aos maiores de 70 anos (até a Lei 12.344/2010, essa imposição acontecia a partir dos 60 anos). Em relação à união estável, desde há muito, o STJ entendia viável a mesma aplicação, prova disso a aprovação da Súmula 655, nesse sentido, em novembro do ano passado.
Nesses casos, o viúvo terá direito à meação dos bens adquiridos onerosamente, por força da aplicação da Súmula 377 do STF. Todavia, o entendimento do STJ é de que para fazer jus a esses valores, necessariamente, o parceiro afetivo precisa demonstrar a existência de esforço comum. Em concorrência com descendentes, não há direito hereditário ao cônjuge ou companheiro nesse regime de bens e essa é a discussão do caso julgado pelo Tribunal Goiano. Em síntese: para os descendentes do falecido é interessante o reconhecimento de que a relação era norteada pela separação obrigatória para que, em consequência, o sobrevivente não receba direitos hereditários.
CNB/GO – Como a divisão de bens em uniões estáveis difere daquelas em casamentos?
Conrado Paulino da Rosa: Desde 2017, oportunidade em que o STF julgou os temas 498 e 809, que declarou inconstitucional o artigo 1.790 do Código Civil – que tratava da sucessão do companheiro – todos os direitos assegurados à família matrimonial são aplicáveis às famílias convivências.
CNB/GO – Quais são os possíveis desafios legais quando há conflitos entre herdeiros e um cônjuge sobrevivente em relação à partilha de bens?
Conrado Paulino da Rosa: O desafio dessa temática é que, no ano passado, o STF admitiu repercussão geral no Tema 1236, onde analisará se é constitucional a imposição de regime de separação obrigatória aos maiores de 70 anos.
Em meu sentir, dentro do que, inclusive, defendo em meus livros, é que seja reconhecida a inconstitucionalidade vez que o fator etário não é sinônimo de limitação cognitiva. Não podemos esquecer que, na atualidade, um septuagenário pode ser, até mesmo, Ministro do STF. Privar essa mesma pessoa de escolher seu regime de bens beira o absurdo. Imaginarmos que alguém somente se casaria com um septuagenário por interesse patrimonial e o que é pior, restringir sua autonomia privada, em uma das searas mais importantes da sua vida, trata-se de postura aparentemente etarista.
Assessoria de Comunicação CNB/GO
